Mistério da matéria perdida do Universo pode ter sido desvendado

Um artigo publicado nesta segunda-feira (16) na revista Nature Astronomy traz uma solução para um mistério que intriga os astrônomos há décadas: onde está escondida metade da matéria comum desaparecida do Universo. 

Analisando um fenômeno raro chamado rajadas rápidas de rádio (FRBs), pesquisadores conseguiram localizar essa matéria perdida, feita de átomos, que forma tudo o que conhecemos, como estrelas, planetas e pessoas.

Essa matéria desaparecida não é a famosa matéria escura, que representa a maior parte da massa do Universo e continua invisível aos telescópios. O problema era com a matéria normal, composta por partículas chamadas bárions, que interagem com a luz, mas que estavam espalhadas de forma tão difusa que não podiam ser detectadas diretamente.

Animação mostra o aparecimento de rajadas rápidas de rádio (FRBs) em todo o céu. Créditos: NRAO Outreach/T. Jarrett (IPAC/Caltech); B. Saxton, NRAO/AUI/NSF)

Cientistas conseguem “pesar” matéria perdida usando rajadas rápidas de rádio 

O sumiço dessa matéria era um desafio para a cosmologia, a ciência que estuda a origem e a evolução do Universo. Embora os cientistas soubessem que ela existia, sua localização exata permanecia desconhecida. Eles suspeitavam que ela estivesse espalhada em nuvens de gás entre as galáxias, como demonstrou um estudo divulgado no mês passado, mas ainda faltavam provas.

Agora, uma equipe formada por cientistas dos EUA, conseguiu “pesar” essa matéria invisível com a ajuda das FRBs. Essas explosões de energia duram apenas milissegundos, mas liberam tanta energia quanto o Sol em 30 anos. Por serem tão rápidas e intensas, elas funcionam como verdadeiros faróis, iluminando o espaço entre suas galáxias de origem e a Terra.

O novo estudo localizou a matéria “perdida” do Universo usando rajadas rápidas de rádio (FRBs) – sinais de rádio breves e brilhantes de galáxias distantes – como guia. Crédito: Melissa Weiss/CfA

Leia mais:

Você existe graças ao desequilíbrio entre matéria e antimatéria no Universo

Pesquisa profunda traz novo mapa de toda a matéria no Universo

Cientistas investigam uma nuvem do quinto estado da matéria

Em um comunicado, Liam Connor, pesquisador do Centro de Astrofísica Harvard-Smithsonian, as FRBs atravessam o meio intergaláctico, uma espécie de névoa cósmica invisível. Ao medir como a luz dessas explosões se espalha ao passar por essa névoa, os cientistas conseguem calcular a quantidade de matéria existente no caminho.

Apesar de milhares de FRBs já terem sido detectadas, apenas algumas são úteis para esse tipo de estudo. Isso porque é necessário saber exatamente de qual galáxia a FRB veio e a distância entre essa galáxia e a Terra. Até agora, os astrônomos conseguiram localizar com precisão apenas cerca de 100 dessas fontes.

Nesta pesquisa, os cientistas usaram dados de 69 FRBs, com distâncias variando entre 11,7 milhões e 9,1 bilhões de anos-luz. Uma dessas fontes, chamada FRB 20230521B, é a FRB mais distante já identificada. Essa variedade de distâncias permitiu um mapeamento mais detalhado da matéria ao longo do Universo.

A maioria das FRBs utilizadas foi detectada por uma rede de 110 radiotelescópios nos EUA, chamada Deep Synoptic Array (DSA), que pertence ao Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech). Outros sinais vieram de uma instalação na Austrália chamada ASKAP, especializada na busca por FRBs.

Novo radiotelescópio deve ampliar conhecimento sobre o Universo

O método usado pelos cientistas lembra o funcionamento de um prisma. Quando a luz das FRBs passa pela matéria no espaço, ela se divide em diferentes comprimentos de onda, como a formação de um arco-íris. Analisando essa separação, é possível medir a quantidade de matéria pelo caminho.

Vikram Ravi, professor assistente do Caltech, explica que é como observar a sombra de uma pessoa. “Se você vir uma pessoa na sua frente, poderá descobrir muito sobre ela. Mas se você vê apenas a sombra dela, ainda saberá que ela está lá e aproximadamente o quão grande ela é”. No caso das FRBs, elas funcionam como uma luz de fundo, revelando a presença da matéria oculta.

Matriz de rádio DSA-110 no Rádio Observatório de Owens Valley. Crédito: Vikram Ravi/Caltech/OVRO

O estudo conclui que cerca de 76% da matéria normal do Universo está no meio intergaláctico, 15% nos halos difusos ao redor das galáxias e apenas 9% dentro das próprias galáxias, formando estrelas e gás. Esses resultados batem com o que simulações de computador já previam, mas agora foram confirmados por observações reais.

Os autores da pesquisa acreditam que essa descoberta vai ajudar a entender melhor como as galáxias crescem e evoluem. O próximo passo será o lançamento de um novo radiotelescópio, o DSA-2000, que deve localizar até 10 mil FRBs por ano, ampliando ainda mais nosso conhecimento sobre o Universo.

O post Mistério da matéria perdida do Universo pode ter sido desvendado apareceu primeiro em Olhar Digital.