Vacina experimental contra HIV gera anticorpos em 80% dos casos

Uma vacina experimental contra o HIV, desenvolvida com tecnologia de RNA mensageiro (mRNA), mostrou respostas imunológicas potentes em estudos com animais e humanos.

Os resultados, publicados nessa quarta-feira (30/7) na revista Science Translational Medicine, indicam que a nova formulação gerou anticorpos neutralizantes em 80% dos participantes. A taxa de resposta é considerada alta, especialmente em comparação com tentativas anteriores, que enfrentaram dificuldades para induzir proteção.

Como funcionam as vacinas mRNA?

As vacinas mRNA levam para o corpo uma cópia sintética do RNA mensageiro, que contém instruções genéticas para produzir uma proteína do vírus.
O imunizante não contém o vírus vivo ou inativado, apenas a informação para o corpo simular uma parte dele.
Quando o mRNA entra nas células, ele orienta a produção de uma proteína específica do vírus. No caso do HIV, por exemplo, pode ser uma parte da estrutura externa do vírus.
O corpo reconhece essa proteína como um invasor e começa a produzir anticorpos e células de defesa, preparando-se para combater o vírus real caso haja contato futuro.
Como o mRNA pode ser sintetizado em laboratório com agilidade, vacinas com essa tecnologia costumam ter produção mais rápida e com menor custo.
O mRNA não entra no núcleo da célula e não interage com o DNA. Ele é temporário e é eliminado pelo organismo depois de cumprir sua função.

O HIV tem uma estrutura viral complexa e mutável, o que torna o desenvolvimento de vacinas particularmente desafiador. Um dos obstáculos envolve o chamado trímero do envelope viral, uma proteína que fica na superfície do HIV e serve como alvo para anticorpos.

Em vacinas convencionais, esse trímero precisa ser apresentado de forma solúvel, o que deixa uma região chamada “base” exposta e acaba induzindo o sistema imunológico a produzir anticorpos ineficazes.

13 imagensFechar modal.1 de 13

HIV é a sigla em inglês do vírus da imunodeficiência humana. O causador da aids ataca o sistema imunológico, responsável por defender o organismo de doenças. Os primeiros sintomas são muito parecidos com os de uma gripe, como febre e mal-estar. Por isso, a maioria dos casos passa despercebida

Arte Metrópoles/Getty Images2 de 13

A baixa imunidade permite o aparecimento de doenças oportunistas, que recebem esse nome por se aproveitarem da fraqueza do organismo. Com isso, atinge-se o estágio mais avançado da doença, a aids

Anna Shvets/Pexels3 de 13

Os medicamentos antirretrovirais (ARV) surgiram na década de 1980 para impedir a multiplicação do HIV no organismo. Esses medicamentos ajudam a evitar o enfraquecimento do sistema imunológico

Hugo Barreto/Metrópoles4 de 13

O uso regular dos ARV é fundamental para aumentar o tempo e a qualidade de vida das pessoas que vivem com HIV e reduzir o número de internações e infecções por doenças oportunistas

iStock5 de 13

O tratamento é uma combinação de medicamentos que podem variar de acordo com a carga viral, estado geral de saúde da pessoa e atividade profissional, devido aos efeitos colaterais

iStock6 de 13

Em 2021, um novo medicamento para o tratamento de HIV, que combina duas diferentes substâncias em um único comprimido, foi aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)

Hugo Barreto/Metrópoles7 de 13

A empresa de biotecnologia Moderna, junto com a organização de investigação científica Iavi, anunciou no início de 2022 a aplicação das primeiras doses de uma vacina experimental contra o HIV em humanos

Arthur Menescal/Especial Metrópoles8 de 13

O ensaio de fase 1 busca analisar se as doses do imunizante, que utilizam RNA mensageiro, podem induzir resposta imunológica das células e orientar o desenvolvimento rápido de anticorpos amplamente neutralizantes (bnAb) contra o vírus

Arthur Menescal/Especial Metrópoles9 de 13

Nos Estados Unidos, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças aprovou o primeiro medicamento injetável para prevenir o HIV em grupos de risco, inclusive para pessoas que mantém relações sexuais com indivíduos com o vírus

spukkato/iStock10 de 13

O Apretude funciona com duas injeções iniciais, administradas com um mês de intervalo. Depois, o tratamento continua com aplicações a cada dois meses

iStock11 de 13

O PrEP HIV é um tratamento disponível no Sistema Único de Saúde (SUS) feito especificamente para prevenir a infecção pelo vírus da Aids com o uso de medicamentos antirretrovirais

Joshua Coleman/Unsplash12 de 13

Esses medicamentos atuam diretamente no vírus, impedindo a sua replicação e entrada nas células, por isso é um método eficaz para a prevenção da infecção pelo HIV

iStock13 de 13

É importante que, mesmo com a PrEP, a camisinha continue a ser usada nas relações sexuais: o medicamento não previne a gravidez e nem a transmissão de outras doenças sexualmente transmissíveis, como clamídia, gonorreia e sífilis, por exemplo

Keith Brofsky/Getty Images

Vacina ligada à membrana teve melhor desempenho

Para contornar o problema, os cientistas criaram duas versões da vacina de mRNA. A primeira seguiu o modelo tradicional, com a proteína solúvel. A segunda induziu o corpo a produzir a proteína do vírus já ancorada à membrana celular, o que imita de forma mais precisa o vírus real e evita a ativação de anticorpos direcionados à base do envelope.

Nos testes realizados em coelhos e macacos, a vacina ligada à membrana apresentou melhores resultados. Em seguida, os pesquisadores avançaram para um ensaio clínico com 108 voluntários. Os participantes receberam três doses da vacina e foram monitorados quanto à segurança e resposta imunológica.

Leia também

Saúde

“Casos de HIV cairão em 2025”, avalia diretor do Ministério da Saúde

Saúde

Cientistas desenvolvem 1º tratamento contra HTLV, vírus “primo” do HIV

Saúde

Injeção que previne HIV poderia ser mil vezes mais barata, diz estudo

Saúde

Lenacapavir: entenda o diferencial do tratamento para prevenir o HIV

O desempenho da versão ancorada à membrana foi o mais promissor, com 80% dos vacinados produzindo anticorpos neutralizantes. A fórmula com a proteína solúvel, por outro lado, teve resposta bem mais baixa, registrada em apenas 4% dos participantes.

Os efeitos colaterais foram leves na maioria dos casos e não houve registros de reações graves. A única exceção foi uma taxa um pouco acima da média de urticária, observada em 6,5% dos voluntários.

A partir desses dados, os pesquisadores afirmam que a abordagem com trímero ancorado à membrana representa uma plataforma promissora para o desenvolvimento clínico de uma vacina eficaz contra o HIV.

Além da eficácia observada, a tecnologia de mRNA oferece vantagens como produção mais rápida e custo potencialmente mais baixo, o que pode facilitar o acesso a essa possível futura vacina.

Siga a editoria de Saúde e Ciência no Instagram e fique por dentro de tudo sobre o assunto!