Nuvens inexplicáveis de gás gelado revelam surpresa no coração da Via Láctea

Um artigo publicado no periódico científico The Astrophysical Journal Letters traz novas pistas sobre as bolhas de Fermi – misteriosas estruturas gigantes de plasma superaquecido que se erguem acima e abaixo do centro da Via Láctea, estendendo-se por cerca de 50 mil anos-luz (o equivalente a metade do diâmetro da galáxia).

Usando o Telescópio Green Bank, Fundação Nacional de Ciências dos EUA (NSF), na Virgínia Ocidental, os pesquisadores descobriram algo inesperado no interior dessas bolhas: enormes nuvens de hidrogênio frio. A presença dessas concentrações de gás em um ambiente tão extremo surpreendeu os cientistas, já que, teoricamente, elas não deveriam resistir por tanto tempo ao calor intenso.

Nuvens de gás hidrogênio se escondem dentro das bolhas de Fermi, segundo estudo. Crédito da imagem: NSF/AUI/NSF NRAO/P.Vosteen

Em resumo:

Pesquisa recém-publicada traz novas informações sobre as bolhas de Fermi;

Foram detectadas nuvens frias dentro dessas formações superaquecidas existentes na Via Láctea;

Essas nuvens seriam restos de estruturas maiores formadas há milhões de anos;

Descoberta sugere erupções recentes do buraco negro supermassivo no centro galáctico;

A Idade das bolhas indica eventos violentos ocorridos há poucos milhões de anos.

Cubos de gelo jogados na água fervente

De acordo com os autores do estudo, essas nuvens provavelmente são restos de estruturas muito maiores formadas no centro da galáxia há milhões de anos. Em entrevista ao site Space.com, o físico Rongmon Bordoloi, da Universidade Estadual da Carolina do Norte, líder da pesquisa, comparou o fenômeno a colocar um cubo de gelo em água fervente: os menores derretem rápido, mas os maiores resistem por mais tempo, mesmo que parcialmente dissolvidos.

Segundo Bordoloi, a descoberta pode indicar que o buraco negro supermassivo no centro da Via Láctea tenha liberado jatos de matéria de forma violenta em um passado mais recente do que se imaginava. Esse evento teria expelido plasma a altíssimas temperaturas e arrastado matéria para o espaço, formando as bolhas.

Ao fundo, a Via Láctea, com o buraco negro supermassivo Sagitário A* no destaque. Créditos: Via Láctea (Muratart – Shutterstock); Buraco negro (EHT). Edição: Olhar Digital

Identificadas pelo Telescópio Espacial de Raios Gama Fermi, da NASA, em 2010, as bolhas só são visíveis nessa faixa de radiação. Elas se sobrepõem a outra estrutura igualmente misteriosa, detectada em raios X, conhecida como bolhas eROSITA. O plasma em seu interior chega a cerca de um milhão de graus Celsius.

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As nuvens frias detectadas pelo novo estudo medem de 13 a 91 anos-luz de diâmetro, dimensões muito superiores às do Sistema Solar. Para que tenham sobrevivido cerca de 13 mil anos-luz acima do centro da galáxia, no coração das bolhas, é provável que fossem ainda maiores quando foram lançadas para essa região.

“Em teoria, essas nuvens não deveriam ter sobrevivido tanto tempo”, diz Bordoloi, explicando que sua existência funciona como uma espécie de “relógio natural”, sugerindo que a última grande erupção do buraco negro central ocorreu apenas alguns milhões de anos atrás – um intervalo extremamente curto na escala cósmica.

Distribuição da névoa galáctica vista pela missão Planck, da Agência Espacial Europeia (ESA) em frequências de micro-ondas sobrepostas ao céu de alta energia, conforme visto pelo Telescópio Espacial de Raios Gama Fermi, da NASA. Crédito: ESA/Planck Collaboration (micro-ondas); NASA/DOE/Fermi LAT/Dobler et al./Su et al. (raios gama)

Essa conclusão ajuda a restringir a idade das bolhas de Fermi e reforça a hipótese de que o Sagitário A*, o buraco negro no coração da Via Láctea, pode ter erupções violentas sempre que grandes quantidades de material caem nele. Apesar disso, o momento exato de cada evento ainda é desconhecido.

Para Bordoloi, fenômenos como as bolhas de Fermi e as bolhas eROSITA revelam que o centro da nossa galáxia foi muito mais ativo no passado recente do que se acreditava, e podem ser a chave para entender o comportamento explosivo do seu núcleo.

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