Fazendas no mar: o que são e como aproveitar produção da Amazônia Azul

O Brasil é um dos países com maior costa marítima do mundo. Também conhecida como Amazônia Azul, a faixa de mar possui mais de 5,6 milhões de km², uma superfície maior do que a região Norte e Nordeste do país somadas. Mas, apesar do tamanho do território, o uso dele em projetos de enfoque econômico e social na bioeconomia marinha ainda é incipiente.

Não há dados de qual proporção da Amazônia Azul tem sido explorada de forma sustentável, mas pesquisadores debruçados sobre o tema indicam que são pouquíssimas as fazendas no mar brasileiro.

“O Brasil, infelizmente, desperdiça este potencial. Poderíamos ser líderes no uso sustentável dos recursos naturais marinhos, ou ao menos estar no top 3 de países produtores, mas não vemos isso sair do papel. Mas a agricultura no mar precisa migrar para áreas de oceano aberto, permitindo o adensamento de vastas regiões marinhas. Hoje, nossa Amazônia Azul, uma zona exclusiva para o Brasil, está vazia”, afirma o oceanógrafo Fabiano Thompson, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

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Estudo mostra vazio do tema

Um estudo recente publicado na quinta-feira (4/9) na revista Desenvolvimento e Meio Ambiente mostrou o esvaziamento e os conflitos relacionados à economia azul no Brasil. Dos quase 1,5 mil projetos pensados para o setor entre 2012 e 2020, só um, com um orçamento de apenas cerca de 8 mil reais, era integralemente voltado à aquicultura e pesca. Os demais se mesclavam com outras formas de desenvolvimento costeiro.

Além disso, o artigo identificou, no período, 133 casos de conflitos envolvendo pesca artesanal no país. Eles estão ligados a desenvolvimento costeiro, mudanças no uso do território (como degradação ambiental, especulação imobiliária e restrições de acesso) e atividades do setor energético, especialmente no Sudeste e Nordeste, como exploração de petróleo, energia eólica e usinas.

A pesquisadora Deborah Prado, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e uma das autoras do artigo, comentou à Agência Bori: “O que nos surpreendeu foi a clareza com que o cruzamento dos dados sobre conflitos e injustiças vivenciadas pelas comunidades a partir de uma série de base de dados revelou-se alinhado ao baixo investimento no setor, evidenciando um cenário mais crítico do que imaginávamos”.

Fazendas no mar: quanto mais variadas, melhor

Segundo ele, as práticas atuais de cultivo no mar colocam a aquicultura como uma das estratégias de produção de alimentos menos poluentes e com maior capacidade regenerativa. No Brasil, ela envolve o cultivo de macroalgas, moluscos, camarões e até peixes ornamentais. Além da produção de alimentos, gera também insumos para fertilizantes, bioplásticos, fármacos e biocombustíveis.

O oceanógrafo Alexandre Mazzer, no entanto, lembra que projetos de aquicultura devem ser parte de um planejamento marinho e zoneamento territorial da superfície aquática, que ainda são muito incipientes.

“Temos que nos planejar para nos adaptar às realidades nacionais e regionais. A organização tem grande importância para diminuir possíveis conflitos de usos: navegação, agricultura, pesca, exploração de óleo e gás, recreação e conservação ambiental, por exemplo”, explica.

Cultivos da aquicultura realizados até início dos anos 2000 normalmente repetiam erros que acontecem em fazendas terrestres, mantendo apenas um animal ou vegetal sendo reproduzido em grande escala. As pesquisas mais recentes, porém, mostram que criar uma cadeia equilibrada de espécies traz melhores resultados.

“Peixes fornecem resíduos que servem de nutrientes para algas e moluscos, enquanto algas purificam a água e capturam carbono, criando um ciclo fechado e eficiente”, resume Thompson.

Embora vários projetos privados ou de instituições públicas tenham pequenos empreendimentos de aquicultura no Brasil, segundo os oceanógrafos, o país ainda está longe de atingir seu potencial. Cobrir esse gargalo daria soluções rápidas a algumas demandas nacionais.

Veja quais são as fazendas no mar com maior potencial para o país

Macroalgas

Podem ser usadas como biofertilizantes, bioplásticos, fármacos e biocombustíveis. Uma fazenda de 100 hectares seria capaz de suprir até 10% da demanda do agronegócio por biofertilizantes, além de atuar na captura de carbono.

Elas ainda podem gerar bioplásticos que se degradam sem liberar microplásticos nos oceanos e que são fonte de combustível reciclável. Além disso, são amigas do meio ambiente. Por estocarem até cinco vezes mais dióxido de carbono do que florestas tropicais terrestres, podem ser fundamentais no mercado de créditos de carbono.

Moluscos

A categoria inclui vieiras, ostras e mexilhões, e sua importância vai além da alimentação. As vieiras, por exemplo, podem gerar heparina, anticoagulante usado mundialmente. Santa Catarina e Rio de Janeiro já produzem ostras e mexilhões, mas ainda em escala modesta em comparação com outros países.

Camarão

Já é o produto mais produzido por aquicultura no Brasil, mas estamos longe de atingir a capacidade total desta indústria. A implementação de técnicas de melhoramento genético que facilitam a reprodução e a engorda poderiam fazer os níveis atuais de produção dobrarem em apenas quatro meses.

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