Na Amazônia, 32% das pessoas já foram afetadas por mudanças climáticas

As mudanças climáticas já fazem parte do cotidiano de um em cada três moradores da Amazônia. As previsões de um futuro distante e catastrófico já são uma realidade para 32% moradores dos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins, além de parte do Maranhão e Mato Grosso. Entre povos e comunidades tradicionais, o número de pessoas prejudicadas chega a 42,2%.

Os dados foram revelados por um levantamento da Umane e da Vital Strategies, com apoio do Instituto Devive. O estudo “Mais Dados, Mais Saúde – Clima e Saúde na Amazônia Legal” ouviu 4 mil pessoas entre maio e julho de 2025, incluindo habitantes dos nove estados abastecidos pela bacia do Amazonas e grupos de comunidades isoladas.

A percepção sobre os impactos do aquecimento global no cotidiano da Amazônia é quase unânime. Segundo o levantamento, 88,4% dos entrevistados acreditam que as mudanças climáticas estão ocorrendo e 90,6% concordam que o planeta já aqueceu. Essa consciência decorre da vivência direta com fenômenos extremos que alteram o ambiente e a saúde.

Leia também

Brasil

Desmatamento na Amazônia caiu 41% em agosto, aponta pesquisa

Brasil

MapBiomas: Amazônia perdeu 52 milhões de hectares nativos em 40 anos

Mundo

Incêndios na Amazônia comprometem qualidade do ar em outros países

Brasil

Dez municípios concentram quase 30% do desmatamento na Amazônia

Como os efeitos da devastação atingem a rotina na Amazônia?

A percepção das mudanças climáticas apareceu no dia a dia dos moradores da região de diversas formas. O aumento da conta de energia foi citado por 83,4% dos participantes, seguido do calor mais intenso (82,4%) e da piora na qualidade do ar (75%). Para 74,4%, os desastres ambientais, como queimadas da vegetação e secas dos cursos de água, tornaram-se mais comuns nos últimos tempos

O estudo mostra que nove em cada dez moradores reconhecem mudanças no ambiente em locais importantes para suas vidas. Quase 40% afirmaram conhecer alguém diretamente afetado pelos eventos climáticos. Entre comunidades tradicionais, essa proporção sobe para quase a metade.

Os reflexos também atingem o bolso. Entre os entrevistados, 73% notaram alta nos preços dos alimentos. “Essas porcentagem representam milhões de pessoas e com elas fica evidente o impacto dessas mudanças na vida cotidiana”, afirma a nutricionista Luciana Vasconcelos Sardinha, diretora-adjunta da Vital Strategies, e uma das responsáveis pelo estudo.

A crise ambiental também alterou hábitos. Metade dos entrevistados reduziu práticas que considera prejudiciais ao clima, e 38,4% relataram culpa ao desperdiçar energia. A separação de lixo é comum a 64% dos moradores, com maior adesão entre comunidades tradicionais (70,1%).

Cenário mais grave em comunidades tradicionais

Os problemas se agravam nas comunidades tradicionais. Quase um quarto delas (24,1%) relatou piora na qualidade da água e 21,4% mencionaram prejuízos na capacidade de produção de alimentos. Esses grupos vivem em áreas mais expostas e dependem diretamente dos recursos naturais para subsistência.

“As mudanças têm levado a uma transformação direta no território. Eles estão vendo essas transformações nos seus modos de vida, com alterações socioambientais, culturais e econômicos para estas pessoas que se auto intitulam ‘pertencentes a povos tradicionais’ na nossa pesquisa”, completa Luciana.

Para Luciana Sardinha, esses dados refletem um processo de engajamento. “As populações tradicionais não estão apenas mais expostas, mas também mais conscientes das consequências. Isso ocorre porque vivenciam transformações diretas em seus modos de vida e em suas redes comunitárias”.

A diretora destaca ainda o papel desses grupos na mitigação da crise. “Eles já praticam comportamentos sustentáveis e possuem saberes que podem orientar políticas públicas. O protagonismo dessas comunidades é essencial para reduzir desigualdades e fortalecer a sustentabilidade da Amazônia”.

Como foi feita a pesquisa?

A pesquisa utilizou metodologia de preenchimento voluntário 100% online, alcançando populações de áreas remotas que anteriormente não haviam entrado em levantamentos desse tipo. “A importância dessa metodologia é chegar onde seria difícil por telefone ou presencialmente, garantindo representatividade e rapidez”, explica Luciana.

A coleta considerou parâmetros populacionais do Censo 2022 e da Pesquisa Nacional de Saúde de 2019 para criar uma precisão estatística e levar a mudanças práticas.

“O modelo atual de desenvolvimento da Amazônia tem priorizado grandes negócios, formações de hidrelétricas e desmatamento de áreas para uso agropecuário, um desenvolvimento que é predatório, reforça a pobreza, a desigualdade e a vulnerabilidade”, conclui Luciana.

Siga a editoria de Saúde e Ciência no Instagram e fique por dentro de tudo sobre o assunto!