Você sabia que sempre vemos o mesmo pedaço da Lua? Sim, existe um pedaço do satélite natural que nunca conseguiremos enxergar da Terra, o chamado lado oculto da Lua. A impossibilidade ocorre devido à rotação síncrona, ou seja, a Lua leva o mesmo tempo para girar em torno do próprio eixo e para orbitar o nosso planeta, impossibilitando a visão de uma de suas partes.
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De acordo com a astrofísica Karín Delmestre, essa sincronização não acontece por acaso. “No início da história do sistema Terra-Lua, a rotação da Lua era mais rápida, mas as forças de maré exercidas pela Terra foram gradualmente desacelerando esse movimento até estabilizá-lo”, explica a professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Por ser um lugar ainda pouco explorado, o lado oculto pode abrigar diversas evidências para explicar as origens e transformações da Lua.
“Explorar o lado oculto é como abrir uma janela para o passado do Sistema Solar. Ele guarda uma ‘versão primitiva’ da Lua, muito diferente do lado que vemos daqui”, revela a pesquisadora apoiada pelo Instituto Serrapilheira.
Karín afirma que o hemisfério lunar voltado para a Terra tem mares lunares – grandes planícies escuras formadas por antigos fluxos de lava – e uma crosta mais fina e com muitos elementos radioativos. Já o lado oculto é mais puro, com crosta espessa e com poucos mares, indicando uma história geológica distinta.
Descoberta mais recente
Recentemente, o local cheio de mistérios foi palco de uma descoberta rara: cientistas detectaram partículas de poeira de um tipo raro de meteorito no lado oculto da Lua, o condrito carbonáceo do tipo Ivuna (condrito CI). Os fragmentos foram coletados durante a missão Chang’e-6, realizada pela Administração Espacial Nacional da China entre maio e junho de 2024.
A descoberta surpreendeu a comunidade científica, pois o meteorito é composto por até 20% de água, sendo um dos tipos mais “molhados”. O achado reforça a teoria que meteoritos antigos foram responsáveis por trazer água para a Lua e até para a Terra.
“A detecção e classificação dessas relíquias de impacto impõem restrições significativas às proporções de materiais meteoríticos no sistema Terra-Lua e suas potenciais contribuições para os estoques de água na superfície lunar”, escrevem os autores no artigo.
Ilustração mostra lado que não vemos da Lua
Uma das teorias mais aceitas pela comunidade científica é que a Lua se formou a partir da “batida” entre a proto-Terra (Terra em formação) e um corpo rochoso chamado Theia. Após o impacto, o satélite natural incorporou detritos em sua composição e se resfriou de maneira desigual – o lado voltado para a Terra esfriou mais lentamente, enquanto o lado oculto ficou frio rapidamente.
“O estudo do lado oculto, especialmente com as novas amostras da missão chinesa, pode confirmar essas hipóteses e até ajudar a entender melhor a origem da água e dos materiais orgânicos que chegaram à Terra. Em outras palavras, investigar o lado oculto é estudar as próprias origens da Terra e da vida”, diz Karín.
Exploração complicada
Não é nada fácil explorar o lado oculto da Lua, visto que a viagem até lá inclui problemas de comunicação, pouso e clima. A massa lunar dificulta a chegada de sinais de rádio, sendo necessário o uso de satélites artificiais orbitando a Lua para se comunicar.
O terreno acidentado do local e a falta de atmosfera dificultam o encontro de pontos seguros para pousar controladamente. Além disso, se você pensa em algum dia ir para lá, pode preparar os casacos: algumas regiões apresentam temperaturas extremas, podendo chegar a -200ºC à noite.
Próximo destino da corrida espacial
Mesmo assim, a recente investigação chinesa chamou a atenção, aumentando o interesse mundial pelo lado lunar “escondido”. Com tantos segredos sobre a história do Sistema Solar a serem desvendados, não deve tardar para outras potências espaciais enviarem missões para lá.
Além disso, o pedaço oculto também é um bom espaço para instalar radiotelescópios, livres das interferências de rádio da Terra, se tornando um destino espacial estratégico no futuro.
“Até pouco tempo atrás, ele era uma região quase inatingível, mas agora sabemos que há ali registros intactos de impactos antigos. A tendência é que, nos próximos anos, vejamos uma nova corrida lunar — desta vez, não apenas para chegar à Lua, mas para entender profundamente sua história e o que ela pode nos ensinar sobre o próprio planeta em que vivemos”, finaliza a pesquisadora.
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