Cérebro tem ‘botão de dor’ escondido, diz pesquisa

Pesquisadores identificaram um novo “botão de dor” no cérebro. Trata-se de uma enzima que atua fora das células nervosas e aciona a sensação dolorosa. O mecanismo funciona como uma etapa extra de comunicação entre neurônios antes do sinal seguir pelo sistema nervoso. Ele não bloqueia ou desativa totalmente os receptores; apenas liga a via da dor, como se fosse um interruptor.

A descoberta muda a forma como a ciência entende esse processo e abre caminho para medicamentos mais seguros. Em vez de agir dentro da célula (onde os remédios costumam causar efeitos colaterais), futuras terapias poderiam atuar do lado de fora. Na prática, isso evitaria problemas comuns de analgésicos atuais, como danos renais e hepáticos. 

A pesquisa foi conduzida por pesquisadores da Universidade de Tulane, nos Estados Unidos. Eles contaram com a colaboração de outras equipes internacionais.

A enzima que atua fora da célula e acende o sinal da dor

A pesquisa mostra que neurônios não se comunicam apenas internamente. Eles também usam uma enzima para alterar proteínas fora da célula, abrindo uma via de sinalização até então desconhecida. 

Neurônios não se comunicam apenas internamente – eles também usam uma enzima para alterar proteínas fora da célula, segundo pesquisa (Imagem: Kateryna Kon/Shutterstock)

Essa enzima, chamada vertebrate lonesome kinase (VLK), é liberada quando os neurônios estão ativos e modifica proteínas no espaço extracelular, algo que pouco se estudava na regulação da dor.

Esse processo é um tipo de fosforilação, mecanismo clássico de controle de proteínas. Mas agora observado num ambiente externo às células nervosas. 

A VLK fosforila o domínio extracelular da proteína EphB2, o que cria uma interação com o receptor N-metil-D-aspartato (NMDAR), regulador central da sinalização de glutamato no cérebro. O resultado é o aumento da função de receptores ligados à percepção de dor.

Para o pesquisador Matthew Dalva, líder do estudo, o achado “abre uma maneira inteiramente nova de pensar sobre como influenciar o comportamento celular”. Isso porque permite projetar medicamentos que atuam de fora da célula, sem precisar atravessá-la. 

A descoberta, portanto, não revela apenas uma função, mas também um ponto estratégico para modular a dor.

Novo caminho de sinalização pode levar a remédios para dor mais seguros

A nova via VLK–EphB2–NMDAR se mostrou indispensável para a dor causada por lesão. Em testes com camundongos, quando os cientistas removeram a VLK de neurônios sensíveis à dor, os animais deixaram de sentir o incômodo pós-cirúrgico. Mesmo assim, mantiveram funções normais, como movimento, percepção de calor e resposta a estímulos químicos.

Graças ao achado, a pesquisa sugere um alvo mais seguro para o desenvolvimento de analgésicos: atuar na enzima extracelular (Imagem: Sergey Nivens/Shutterstock)

Esse comportamento reforçou o papel direto da VLK na ativação da dor, sem interferir em outras funções neurológicas importantes. Quando pesquisadores aumentaram os níveis da enzima, as respostas dolorosas também aumentaram. 

Em comunicado publicado pela Universidade de Tulane, Dalva resume o efeito dessa via ao afirmar que uma “enzima liberada por neurônios pode modificar proteínas na parte externa de outras células para ligar a sinalização da dor – sem afetar o movimento ou a sensação normal”.

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O achado sugere um alvo mais seguro para o desenvolvimento de analgésicos: atuar na enzima extracelular em vez de bloquear o NMDAR, que pode causar efeitos adversos quando inibido diretamente. 

A pesquisa, publicada na revista Science, também amplia o horizonte para outras áreas da neurociência. Isso porque o NMDAR está ligado a aprendizado e memória. E equipes de nove instituições planejam investigar como essa via pode afetar outros processos cerebrais.

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