Evolução dos peixes únicos do Atlântico é desvendada em novo estudo

Um novo estudo publicado no Jornal da USP combinando dados genéticos, biológicos e geográficos reconstruiu, de forma inédita, a história evolutiva dos peixes de recifes que habitam três ilhas oceânicas do Atlântico tropical: São Pedro e São Paulo, Ascension e Santa Helena. Apesar de separadas por grandes distâncias e cercadas por águas abertas, essas ilhas funcionam como um “laboratório natural”, permitindo observar processos de especiação e dispersão que ajudam a explicar como essas comunidades se formaram.

Ao analisar essas regiões, os pesquisadores identificaram que 46 espécies são endêmicas — ou seja, não existem em nenhum outro ponto do planeta. Além disso, as populações insulares apresentam maior afinidade com as comunidades do Atlântico Ocidental, semelhantes às encontradas no Brasil e no Caribe. As conclusões respondem a uma dúvida antiga entre especialistas: como fauna tão isolada se originou e evoluiu ao longo do tempo.

Ilhas oceânicas como “laboratórios naturais”

De acordo com a pesquisadora Isadora Cord, autora principal do estudo, essas ilhas oferecem condições ideais para entender processos evolutivos. A combinação de isolamento extremo e populações pequenas favorece o surgimento de novas espécies, já que as barreiras naturais — como correntes, salinidade e temperatura — limitam a dispersão e promovem o isolamento reprodutivo.

As ilhas oceânicas oferecem condições ideais para entender processos evolutivos (Imagem: Juergen Brand / Shutterstock)

Esse cenário explica por que muitas espécies que chegam aos arquipélagos tornam-se exclusivas dessas regiões. Para os pesquisadores, o oceano funciona como um “deserto”, e as ilhas, como raros oásis que permitem que organismos vindos de áreas continentais se estabeleçam.

Entre as contribuições do estudo, os cientistas mapearam rotas antigas que conectam o Atlântico Ocidental, a África e até o Oceano Índico. Para algumas espécies, a história evolutiva remonta a mais de 5 milhões de anos — tempo anterior até à formação das próprias ilhas. Outras são recentes e levaram os pesquisadores a sugerir o reconhecimento de uma nova espécie do gênero Ophioblennius.

Resultados revelam parentescos e padrões evolutivos

A pesquisa mostrou que as comunidades das três ilhas formam uma única unidade biogeográfica, composta por espécies que compartilham uma origem comum. Algumas relações identificadas pelos pesquisadores incluem:

11 espécies presentes apenas nas ilhas oceânicas e no Atlântico Leste

74 espécies distribuídas nos dois lados do Atlântico

44 espécies endêmicas do conjunto de arquipélagos

3 espécies presentes nas três ilhas analisadas

As comunidades das três ilhas formam uma única unidade biogeográfica, composta por espécies que compartilham uma origem comum (Imagem: IBorisoff / iStock)

Para reconstruir a linhagem desses peixes, a equipe utilizou “relógios moleculares”, método que estima o tempo de divergência genética entre espécies. A técnica revelou diferenças que não podem ser vistas a olho nu, ajudando a identificar espécies “crípticas”, que parecem semelhantes, mas são geneticamente distintas.

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O estudo também reforçou a importância das ilhas como refúgios que preservam linhagens frágeis. Por serem exclusivas e terem populações reduzidas, as espécies endêmicas são altamente vulneráveis. Eventos ambientais ou impactos locais podem levá-las rapidamente à extinção.

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