Fototaxia: biólogos explicam por que insetos são atraídos pela luz

No Brasil, o “anúncio” da chegada das chuvas é claro: se a temporada de insetos agitados começa na rua ou em casa, todo mundo já sabe que vem precipitação por aí. Mesmo acontecendo anualmente, o comportamento dos bichos é mais do que uma simples atração e pode trazer consequências para o futuro.

Não é por acaso que os artrópodes são atraídos pela iluminação das cidades. A atitude tem a ver com a biologia sensorial e os mecanismos naturais que os animais utilizam para “navegar” pelos céus afora. A luz é como se fosse um guia e a maioria deles se orienta através de fontes luminosas naturais, como a Lua e as estrelas.

Leia também

Vida & Estilo

Só 1 ingrediente: aprenda truque para manter insetos longe de casa

Vida & Estilo

Chega de mosquitos: truque simples ajuda a afastar os insetos

Ciência

Âmbar encontrado no Equador revela insetos de supercontinente extinto

Ciência

Besouro arretado: novas espécies de insetos são achadas na Caatinga

O comportamento é chamado fototaxia, mas não está presente em todos representantes do grupo: mariposas, besouros, mosquitos e moscas têm fototaxia positiva e são atraídos pela luz. Já formigas e baratas tem fototaxia negativa e fogem da luminosidade.

“A intensidade da atração depende do espectro da luz. A maioria dos insetos é mais atraída por comprimentos de onda curtos, como a luz ultravioleta (UV) e azul”, destaca o biólogo especialista em insetos Reinaldo de Oliveira Elias.

Em termos de evolução da espécie, a atração pela luz mostra um mecanismo sofisticado dos insetos. Na verdade, o grande problema começou com a expansão da urbanização: com ruas e casas cheias de luzes artificiais, os bichos são enganados e acabam “caindo em um golpe” na hora de encontrar o destino correto.

Ao usar as luzes no céu como referência, os insetos sempre vão estar olhando para cima. Porém, se o parâmetro se torna as fontes artificiais, elas estarão ao lado ou abaixo do corpo, fazendo os bichos perderem a estabilidade e voarem em espiral até chegar à lâmpada. Isso explica porque os insetos sempre chegam em looping ao pousar em postes ou na sua casa.

“Eles não buscam a luz porque ‘gostam’. Na verdade, ficam desorientados por causa de mecanismos de navegação que funcionaram perfeitamente durante milhões de anos — mas não foram ‘projetados’ para lidar com lâmpadas artificiais intensas e próximas”, explica o professor de biologia Cristhian Gomes Tavares da Silva, da Rio International School, no Rio de Janeiro.

Como a poluição luminosa impacta a biodiversidade dos insetos

A poluição luminosa é extremamente prejudicial à sobrevivência dos insetos. Estudos apontam que áreas urbanizadas com muita iluminação têm menor abundância e diversidade de artrópodes em comparação a locais escuros. Ao todo, a atração é capaz de alterar três pontos principais na vida dos bichos: ciclos de vida, reprodução e sobrevivência.

Ciclos de vida

Ao avistar pontos de luz artificial, os insetos são facilmente atraídos e gastam muita energia tentando se estabilizar em torno da luminosidade fake. Isso faz com que eles morram por exaustão ou queimados com a colisão em lâmpadas quentes.

Oportunidades de reprodução prejudicadas

A maioria dos adultos tem poucos dias de vida na fase adulta e perdem o curto tempo em volta da luz ao invés de buscar parceiros para se proliferar. “Isso significa menos acasalamento, menos ovos, menos lagartas e menos borboletas no futuro”, diz Silva.

Atração por luzes artificiais pode atrapalhar a sobrevivência dos insetos

Presas fáceis

Como ficam desorientados e cansados ao ficar voando em volta da luz, os insetos se tornam alvos fáceis para serem predados por lagartixas, morcegos e sapos. Os pontos de luminosidade artificial se tornam quase como um “buffet” recheado de opções para esses animais.

É possível reduzir a atração sem apagar as luzes?

Apesar de parecer improvável, é possível não chamar os insetos mesmo de luz acesa. Os bichos voadores são mais atraídos por comprimentos de onda curtos e fontes que emitam luz ultravioleta. O simples ato de trocar lâmpadas frias, como brancas ou azuis, por lâmpadas de LED, que emitem luminosidade amarelada e com comprimentos de onda longos, já salva a vida de vários deles.

“Os raios UV são extremamente atrativos para várias espécies de moscas e outros insetos. Essas armadilhas imitam a luz natural mais atrativa possível. Por isso são usadas em açougues, por exemplo. O inseto é atraído pela luz roxa/UV e morre quando encosta na grade eletrificada”, aponta o professor de biologia Luiz César de Assis, do Colégio Marista Goiânia, em Goiás.

Futuro dos insetos é preocupante

Com o avanço da urbanização e das mudanças climáticas, populações de insetos em várias partes do mundo têm caído drasticamente. Pesquisas recentes apontam que 40% das espécies estão ameaçadas de extinção. “A biodiversidade de insetos está enfrentando uma crise global, frequentemente chamada de ‘apocalipse dos insetos’”, alerta Elias.

Manter insetos saudáveis é muito importante para o funcionamento da vida como um todo, inclusive para nós. Afinal, os bichos são responsáveis por serviços essenciais, incluindo polinização, controle de pragas e decomposição, impactando diretamente a segurança alimentar e a saúde dos ecossistemas. Eles também servem de alimento para várias aves, sapos, roedores e morcegos.

“Trocar uma lâmpada branca por uma amarela na sua varanda ou usar luminárias mais responsáveis pode parecer pequeno, mas é um gesto concreto de conservação ambiental”, exalta Silva.

Siga a editoria de Saúde e Ciência no Instagram e fique por dentro de tudo sobre o assunto!