O tempo passa de forma diferente dependendo da gravidade e da velocidade, e isso já não é apenas um conceito teórico da física. Com a precisão dos relógios atuais, essas variações podem ser medidas até mesmo dentro do próprio planeta. Pesquisadores estimaram que o núcleo da Terra é cerca de 2,49 anos mais jovem que a crosta, uma diferença causada pelo efeito da gravidade sobre o fluxo do tempo.
A explicação está na relatividade: quanto mais intenso é o campo gravitacional, mais lentamente o tempo passa. Como o núcleo está mais profundo no campo gravitacional terrestre, os relógios ali “atrasariam” em relação aos que estão na superfície. Durante décadas, a estimativa mais aceita indicava uma diferença de apenas alguns dias, mas modelos mais refinados mostraram que esse valor estava muito distante da realidade.
Gravidade, relatividade e a idade do planeta
O efeito é semelhante ao conhecido paradoxo dos gêmeos, usado para explicar a dilatação do tempo causada pela velocidade. Nesse exemplo, um gêmeo viaja pelo espaço em alta velocidade e retorna mais jovem do que o outro, que ficou na Terra. No caso do planeta, o fator dominante não é a velocidade, mas a intensidade do campo gravitacional em cada camada.
Em um modelo simplificado, que trata a Terra como uma esfera uniforme, os pesquisadores calcularam que o núcleo seria pelo menos 1,5 ano mais jovem que a superfície. Já em uma abordagem mais realista, baseada no Preliminary Reference Earth Model, que considera a estrutura interna do planeta e a distribuição de massa, a diferença sobe para cerca de 2,49 anos entre a crosta e o núcleo.
Relógios ópticos e medições em montanhas
Essa discussão teórica ganhou um novo impulso com o avanço dos relógios atômicos ópticos, hoje os mais precisos já construídos. Eles são mais de 100 vezes mais exatos do que os relógios atômicos tradicionais, e os cientistas ainda buscam ampliar essa precisão. O nível atual de incerteza chega a cerca de oito partes por dez trilhões de trilhões, o que equivale a um relógio que perderia apenas um segundo uma vez a cada 39,15 bilhões de anos.
Esses relógios usam nuvens de átomos resfriados a temperaturas extremamente baixas e lasers que excitam elétrons em frequências muito específicas. O “tic-tac” é definido quando os elétrons retornam ao estado original e emitem luz, cuja oscilação pode ser medida com extrema precisão.
Um experimento inédito no topo do Mount Blue Sky
A precisão é tão alta que dois desses relógios podem detectar diferenças sutis no campo gravitacional da Terra. Por isso, pesquisadores decidiram levar um relógio óptico para o topo do Mount Blue Sky, uma montanha de 4.348 metros de altitude, no estado do Colorado, nos Estados Unidos. O local abriga um observatório astronômico, o que facilita a instalação do experimento.
Segundo Scott Diddams, professor da Universidade do Colorado Boulder, a iniciativa marca um novo patamar para a tecnologia. “Isso é sem precedentes. Quando construímos os primeiros relógios ópticos há 25 anos, nunca teríamos imaginado uma combinação desse nível de desempenho com operação remota”, afirmou, em comunicado divulgado pela instituição.
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O que vem depois dos testes em altitude
O relógio instalado na montanha será conectado, por comunicação a laser e cabos de fibra óptica, a outro equipamento mantido no laboratório da Universidade do Colorado Boulder. A comparação entre os dois permitirá quantificar a dilatação do tempo causada pela diferença de altitude.
Os pesquisadores veem esse experimento como apenas o começo. Tornar esses relógios menores e portáteis pode abrir caminho para aplicações como o monitoramento de mudanças na elevação do solo provocadas pelo derretimento de geleiras ou por movimentos internos da Terra.
Além disso, os relógios ópticos também servem como ferramentas para testar os limites da relatividade geral e da mecânica quântica, explorando como o tempo realmente funciona em diferentes condições do universo.
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