A nova TV aberta 3.0 deve começar a ser implementada no Brasil no primeiro semestre de 2026, e promete mudar a forma com que assistimos televisão. Mas, afinal, o que ela é e como funciona?
Na prática, ainda que o sinal de TV não se torne dependente da internet, a conexão tornará a experiência de ver televisão integrada a sites de compra e redes sociais de modo semelhante ao que o YouTube já faz. O gerente de soluções Adriano Adoryan, da Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP), uma das instituições que está implementando o projeto no Brasil, explica que a TV 3.0 se define pela integração em um espaço único.
“O telespectador deixa de alternar entre TV aberta, TV por assinatura e aplicativos de streaming, pois passa a acessar tudo a partir de um único canal, com navegação semelhante à da televisão tradicional. Além disso, a tecnologia permite interatividade direta pelo controle remoto e traz melhorias perceptíveis na qualidade de som e imagem”, destaca Adoryan.
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Nesse modelo, será mais fácil compartilhar aquilo que se está assistindo e interagir com conteúdos relacionados ao programa, como páginas de venda e fóruns de comentários. A ideia é levar interatividade, recomendação algorítmica e participação direta da audiência, o que já ocorre on-line, para um sistema de radiodifusão clássica.
“Foram mais de 100 cientistas brasileiros envolvidos nos últimos cinco anos nas pesquisas para definir o padrão de TV 3.0 do Brasil, com várias contribuições de novas tecnologias desenvolvidas”, afirma Adoryan.
De acordo com o gerente de soluções, o DTV+ e as normas de interface, privacidade e medição de audiência estabelecem parâmetros que serão modelo para vários outros países. “Nossas decisões e nosso tamanho continental podem impactar os rumos da radiodifusão em diversos outros países, como já influenciaram na digitalização”, completa.
O que é a TV 3.0?
A TV 3.0 aprofunda a evolução da televisão digital iniciada em 2007 ao integrar transmissão tradicional de som e imagem com serviços de internet, permitindo o uso de aplicativos, interatividade e conteúdos sob demanda na TV aberta. Além disso, a TV digital ampliou as faixas de transmissão, permitindo a um mesmo canal criar várias programações simultâneas.
A TV 3.0 mantém o caráter aberto e gratuito da radiodifusão, sem exigir assinatura ou conexão com a internet para funcionamento básico, embora o acesso à rede amplie recursos de interatividade. Os aparelhos compatíveis devem exibir um catálogo de canais logo na tela inicial, com acesso por aplicativos das emissoras, substituindo a troca numérica tradicional.
Tecnologicamente, a TV 3.0 terá imagens com maior qualidade (4K, podendo chegar a 8K) e também mais cores disponíveis no sinal, subindo de 16 milhões para quase 1 bilhão de tons possíveis, o que deve aumentar muito a resolução. O som dos aparelhos também deve ser melhorado e mais facilmente integrado com outros equipamentos como caixas de som.
A internet é necessária?
O sinal continua chegando pela antena, inclusive para alertas de emergência, e a adaptação poderá ocorrer sem troca imediata de televisores, por meio de conversores, em uma migração gradual que começa pelas capitais e pode se estender por até 15 anos segundo o decreto que regulamenta o setor, assinado em agosto deste ano. Mas parte do público já deve acessar a tecnologia durante a Copa de 2026, desde que compre conversores, que devem custar cerca de R$ 350 inicialmente.
A TV 3.0 permitirá mais interatividade e personalização, como votações em tempo real, conteúdos estendidos, serviços de governo digital, alertas de emergência, novos recursos de acessibilidade, publicidade e conteúdos personalizados, e até T-commerce, com compras pelo controle remoto.
Ao mesmo tempo, a implementação enfrenta desafios relacionados aos custos de migração e à limitação do acesso à internet, já que apenas 22% da população com mais de 10 anos possui conectividade considerada satisfatória, o que mantém a desigualdade como obstáculo central para a consolidação do novo modelo.
Mesmo sem a conectividade, porém, a própria visibilidade da TV aberta nos aparelhos também deve mudar. Marcelo Moreno, professor da Universidade Federal de Juiz de Fora, explica que muda a forma como o telespectador acessa a programação. Em vez de ‘caçar’ a TV aberta dentro do aparelho, os canais voltam a estar em posição de destaque em um catálogo de aplicativos, com ícones equivalentes aos canais tradicionais.
“Mas isso não quer dizer que a troca rápida entre canais, o zaping, desaparecerá: a pesquisa mostrou o quanto é importante manter essa cultura do zapeamento e isso se traduz na troca rápida entre os aplicativos das emissoras na TV 3.0”, aponta Marcelo Moreno.
Informação pública reunida
Haverá também uma plataforma comum reunindo os canais da União. Com isso, todo televisor que tenha conexão com a internet poderá acessar o conteúdo dessas emissoras públicas, que funcionarão também como aplicativos, oferecendo programação ao vivo e conteúdos sob demanda personalizados.
“Provisoriamente batizado de Rede Pública, será um canal distribuído via internet, que estará disponível em todos os receptores de TV 3.0 conectados à internet e que vai oferecer serviços de governo digital. Campanhas de vacinação, esclarecimentos em casos de calamidade pública e aplicativos do governo estarão ali disponíveis para a população”, explica Adoryan.
O gerente de soluções avalia que, com a TV 3.0, o Brasil está ampliando a capacidade de combater a desinformação. “Isso gera diálogo, interação e contribui para reduzir as bolhas informacionais porque voltamos a ter uma mesma realidade compartilhada. Então quando falamos de personalização na TV 3.0, ainda temos muito o que experimentar e aprender, mas minha crença é de que será algo muito diferente de nossa experiência digital”, completa.
Mudanças na publicidade e privacidade
A publicidade na TV segue, mas terá outra lógica. “As campanhas poderão ter diferentes vídeos para serem apresentados para diferentes perfis de espectadores, mas a maior parte das inserções seguirá sendo dos mesmos anunciantes, já que a força própria da radiodifusão é ser simultânea para milhares, milhões de pessoas”, afirma o gerente da RNP.
Ainda assim, a personalização da TV 3.0 depende da coleta de dados relacionados à interação do público com cada emissora. Essa coleta será feita de forma segmentada e sem compartilhamento entre canais, com notificação ao telespectador de que está sendo feita e tendo o anonimato obrigatório das informações.
“Os dados permitirão medições mais precisas de audiência e engajamento, além de auxiliar na fiscalização por órgãos reguladores, sem monitoramento individual do que cada pessoa assiste”, conclui Adriano.




