A dengue segue como um dos maiores desafios de saúde pública no Brasil e no mundo. A doença, que já causa impacto em mais de 125 países, vem ampliando sua área de circulação com o avanço das mudanças climáticas e do aquecimento global. No Brasil, o número de municípios infestados pelo Aedes aegypti saltou de 1.753 em 1995 para 5.385 em 2024.
Segundo a professora Raquel Silveira Bello Stucchi, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), essa expansão traz consequências graves. “Entre agosto de 2024 e julho de 2025, mais de 3,6 milhões de pessoas estiveram sob risco de dengue e quase 2,7 mil mortes foram registradas, a maioria no Brasil”, destaca.
Durante o 24º Congresso Brasileiro de Infectologia, realizado em Florianópolis entre os dias 16 a 19 de setembro, a médica apresentou um panorama das vacinas já disponíveis e das que ainda estão em estudo, ressaltando pontos de eficácia, segurança e lacunas que permanecem.
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Atualmente, a única vacina contra a dengue disponível no Brasil é a Qdenga, da farmacêutica Takeda, aprovada para uso em pessoas a partir de 4 anos, com recomendação prioritária para adolescentes de 6 a 16 anos em áreas endêmicas.
Um estudo realizado na Ásia com mais de 20 mil participantes entre 14 e 16 anos, acompanhados por cinco anos, mostrou soroproteção de 63% em quem já havia tido dengue e 51% em soronegativos, resultando em aproximadamente 60% de proteção global contra casos confirmados. A vacina também ofereceu proteção significativa contra hospitalizações, atingindo 86% nos soropositivos e quase 76% nos soronegativos.
Nenhum efeito adverso grave foi observado no estudo, embora a proteção após a primeira dose diminua a partir de 90 dias, reforçando a necessidade da segunda aplicação para manter a imunidade a longo prazo. A especialista destacou que a baixa adesão à segunda dose é um problema recorrente, comprometendo a proteção prolongada.
“Mesmo com resultados positivos, a eficácia da vacina depende de completar o esquema, e muitos adolescentes não recebem a segunda dose, o que limita o impacto da imunização em surtos futuros”, explica a médica.
Reações adversas e segurança
Com mais de 36 milhões de doses aplicadas no Brasil até 2025, foram registrados 124 casos de anafilaxia (reação alérgica), todos tratados com sucesso. Notificações raras de síndrome de Guillain-Barré foram contabilizadas.
A professora ponderou que, embora a taxa seja maior que a esperada em vacinas em geral, não houve mortes. “Esses eventos exigem vigilância, mas não comprometem o balanço de segurança do imunizante”, afirma.
Pesquisas com a vacina do Butantan
Outra expectativa está na vacina desenvolvida pelo Instituto Butantan, ainda não aprovada. Em estudos, ela mostrou eficácia de 80% contra dengue confirmada após dois anos e manutenção de proteção acima de 67% após três anos, sem relatos de eventos graves. Os resultados são animadores, sobretudo em crianças maiores de 7 anos.
Para Stucchi, os avanços são importantes, mas ainda há desafios. “Precisamos de vacinas tetravalentes de dose única, de marcadores sorológicos confiáveis para medir imunidade e de mais pesquisas em idosos e pessoas com comorbidades”, concluiu.
*A repórter viajou a convite da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI).
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