Mesmo “destinado” ao Alzheimer, homem não desenvolve a doença. Entenda

Um caso tem intrigado pesquisadores norte-americanos: apesar de possuir uma mutação genética que causa o desenvolvimento precoce de Alzheimer, Doug Whitney, de 75 anos, continua livre da doença. O mais curioso é que a maioria dos familiares do idoso costuma apresentar sintomas iniciais do Alzheimer por volta dos 50 anos.

O caso chamou a atenção de pesquisadores da Universidade de Washington (WashU), nos Estados Unidos, que resolveram estudar Doug. A pesquisa foi publicada na revista Nature Medicine este ano.

Leia também

Saúde

Cientistas revertem Alzheimer em camundongos usando nanopartículas

Saúde

Cientistas identificam área do cérebro que se degrada com Alzheimer

Saúde

Pesquisa liga acúmulo de gordura no cérebro ao avanço do Alzheimer

Saúde

Alzheimer: o que há de mais novo na medicina para combater a doença?

Para investigar o mecanismo de proteção do cérebro de Doug, foram analisados dados sobre os genes dele, além de informações identificadas em tomografias cerebrais e características biológicas do idoso. Assim, foi detectada quase a falta de acúmulo da proteína tau — fator associado ao desenvolvimento dos sintomas do Alzheimer, como o declínio cognitivo.

“Os resultados indicaram uma resistência notável à patologia tau e à neurodegeneração”, afirma o coautor sênior do estudo, Randall J. Bateman, professor de neurologia na WashU Medicine, em comunicado.

Descoberta do caso

O primeiro contato entre o morador de Seattle e os pesquisadores ocorreu em 2011, quando ele participou de outro estudo: o Dominantly Inherited Alzheimer Network (DIAN). A pesquisa internacional investiga famílias com condições hereditárias que favorecem o desenvolvimento de Alzheimer precoce. No entanto, as particularidades do caso de Doug aumentaram o interesse dos pesquisadores.

“Quando ele veio à WashU Medicine pela primeira vez, junto com seu primo, ele já tinha 10 anos a mais do que a idade de início da doença para sua família”, conta o coautor do estudo, Jorge Llibre-Guerra.

Grande parte dos familiares do idoso teve Alzheimer

Inicialmente, os pesquisadores acreditavam que Doug não possuía a variante genética do gene presenilina 2 (PSEN2), responsável por causar o Alzheimer mais cedo nos familiares dele. “Foi uma grande surpresa descobrir que ele era, na verdade, portador da mutação. Naquele momento, ele ganhou o título de fugitivo, porque conseguiu escapar do curso esperado da doença”, brinca Llibre-Guerra.

O homem é uma dos três indivíduos no mundo que são portadores da mutação de resiliência ao Alzheimer, por isso a equipe resolveu desvendar qual fator ou genes estava “segurando” a ação da mutação PSEN2 no organismo de Whitney.

Possíveis hipóteses

Para causar a doença precocemente, o organismo de portadores da mutação PSEN2 passa por dois estágios: superprodução da proteína amiloide e o acúmulo da proteína tau no cérebro. O primeiro marca o início da progressão do Alzheimer no órgão, já o outro está relacionado ao declínio cognitivo, sintoma característico da condição.

No entanto, os exames do idoso mostraram algo curioso: havia um acúmulo significativo de amiloide, mas a concentração de tau estava apenas em seu lobo occipital esquerdo – setor responsável por processar informações visuais. Em casos típicos de Alzheimer hereditário, a tau se acomoda em várias regiões cerebrais, ficando inicialmente no lobo temporal medial, área associada à memória.

Ainda não se sabe como o cérebro de Whitney resiste ao acúmulo de tau, mas algumas hipóteses são estudadas. Por exemplo, foi identificado que o homem possui genes específicos que podem prevenir a doença, mas ainda faltam confirmações sobre a possibilidade.

Também foi detectado que o cérebro dele tinha um número mais alto de proteínas de choque térmico, responsáveis por redobrar e reparar outras proteínas essenciais danificadas por situações de estresse. Antes de se aposentar, o idoso trabalhava em casas de máquinas de navios com altas temperaturas. Outra aposta dos pesquisadores é que o calor elevou a presença das proteínas de choque térmico.

“Ainda não entendemos como ou se as proteínas de choque térmico podem estar mediando o efeito. No entanto, neste caso, elas podem estar envolvidas na prevenção da agregação e do enovelamento incorreto das proteínas tau, mas não sabemos ao certo”, afirma Llibre-Guerra.

Os cientistas acreditam que caso consigam descobrir como o cérebro do homem resiste, novas terapias podem retardar ou prevenir o Alzheimer. “Esta descoberta pode se tornar uma prevenção poderosa para todos. Apelamos aos pesquisadores para ajudar na busca”, finaliza o pesquisador.

Siga a editoria de Saúde e Ciência no Instagram e fique por dentro de tudo sobre o assunto!