Sabe aquela ideia comum de que grandes corporações só investem naquilo que dá retorno financeiro, deixando de lado pautas importantes para a sociedade ou para o planeta? Pois essa talvez tenha sido a premissa de uma iniciativa global de restauração de florestas tropicais que será discutida na COP30, em Belém, no Pará. Quase como uma isca para garantir a sustentabilidade ao mesmo tempo em que se faz… dinheiro.
O chamado Mecanismo de Reversão de Desmatamento (Reversing Deforestation Mechanism – RDM) pode gerar até US$ 100 bilhões em receitas anuais para 91 países com esse tipo de cobertura vegetal, incluindo o Brasil. A proposta está em um estudo elaborado pelo Climate Policy Initiative em parceria com a PUC-Rio, e foi desenvolvida a pedido do presidente da COP30, embaixador André Corrêa do Lago.
“Uma política florestal eficaz depende não apenas de um bom design, mas também de condições favoráveis — e incentivos — que lhe permitam perdurar além da política”, afirma trecho do relatório, que será integrado à proposta de financiamento de US$ 1,3 trilhão para a transição energética, uma das pautas da conferência de novembro.
Combinando incentivos
O RDM proposto aborda a atual ausência de financiamento robusto para restauração em larga escala, segundo o estudo. O mecanismo seria um complemento ao REDD+ Jurisdicional (JREDD+) e ao Tropical Forest Forever Facility (TFFF), que focam no combate ao desmatamento e na proteção das florestas em pé — instrumentos vulneráveis ao que os autores chamam de “ciclos políticos”.
O novo incentivo foi projetado para recompensar as remoções líquidas de carbono — CO2 capturado por meio da restauração, subtraindo as emissões do desmatamento e da degradação — em nível jurisdicional. Os pagamentos seriam baseados em resultados, vinculados ao desempenho anual, e gerenciados por fundos dedicados para reinvestimento na proteção florestal e no uso sustentável da terra.
“As florestas tropicais devem sair das margens das estratégias climáticas e passar para a vanguarda. As florestas não são apenas vulneráveis às mudanças climáticas — elas são indispensáveis para solucioná-las”, diz o relatório. “ Com políticas personalizadas, financiamento robusto e compromisso político de longo prazo, elas podem proporcionar mitigação climática, proteção da biodiversidade e desenvolvimento sustentável em uma escala que poucas outras soluções conseguem igualar.”
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Quais seriam os benefícios?
Estimativas indicam que a um preço de carbono de US$ 50 por tonelada de CO2, o RDM poderia gerar receitas com valor superior a US$ 5.000 por hectare para 170 milhões de hectares em todo o mundo. A restauração de florestas sob este esquema poderia remover até 2 GtCO2 por ano globalmente nos primeiros anos de operação, o que representa cerca de 11-13% da lacuna de emissões para limitar as mudanças climáticas a 2,0°C em 2035, de acordo com o Relatório de Lacuna de Emissões do PNUMA (2024).
A US$ 50 por tonelada, isso representa aproximadamente US$ 100 bilhões em receitas anuais — ressaltando tanto a importância climática quanto a oportunidade financeira da restauração em larga escala. Em suma, “ao vincular o financiamento climático diretamente aos resultados de carbono verificados, o RDM fornece um caminho escalável e transparente para transformar florestas tropicais em ativos climáticos de alto impacto.”
Por que proteger as florestas?
Além de armazenar imensos estoques de carbono, as florestas tropicais influenciam os padrões de precipitação por meio da evapotranspiração, regulam os ciclos hidrológicos, sustentam a biodiversidade e mais de um bilhão de pessoas, enquanto o desmatamento e a degradação impactam as emissões e perturbam ecossistemas e meios de subsistência.
Ao mesmo tempo, as florestas enfrentam uma vulnerabilidade crescente a temperaturas mais altas, alterações na precipitação, secas prolongadas e incêndios florestais mais frequentes. Essa dinâmica bidirecional significa que a perda de florestas acelera as mudanças climáticas, enquanto as mudanças climáticas prejudicam a resiliência das florestas.
“As florestas não são apenas vulneráveis às mudanças climáticas — elas são indispensáveis para resolvê-las”, concluem os pesquisadores.
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