Maçarico-de-bico-fino: saiba como era ave que foi declarada extinta

A União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) declarou, no último dia 10, que o maçarico-de-bico-fino (Numenius tenuirostris) foi oficialmente extinto. A ave migratória, antes comum na Europa, norte da África e Ásia Ocidental, desapareceu e, após 30 anos sem registros de avistamento do animal, ele foi considerado oficialmente perdido.

Para os pesquisadores da UICN, o anúncio marca a primeira extinção global de uma espécie de ave migratória que antes era amplamente distribuída em vários continentes. Embora extinções não sejam incomuns, elas costumam atingir com maior facilidade animais que estão restritos a um habitat menor ou isolado em pequenas comunidades, o que não era o caso do pássaro.

Leia também

Brasil

Veado albino de SC corre risco de extinção e gera alerta

Ciência

Como funcionam os projetos de reintrodução de espécies em extinção

Distrito Federal

Zoo de Brasília recebe casal de saguis raros ameaçados de extinção

Ciência

Saiba quais são os animais que correm mais risco de extinção no Brasil

O último registro confirmado ocorreu em 25 de fevereiro de 1995, em Merja Zerga, uma lagoa de maré no Marrocos. Desde então, pesquisadores tentaram localizar novos indivíduos, mas não encontraram nenhum exemplar. O animal media cerca de 40 centímetros e tinha o bico fino e curvado para baixo, usado para capturar insetos e pequenos crustáceos.

“A extinção do maçarico-de-bico-fino é um momento trágico e preocupante para a conservação das aves migratórias. Esperamos que a perda desta espécie sirva de alerta para proteger outras que ainda podem ser salvas”, afirmou Amy Fraenkel, secretária executiva da Convenção sobre a Conservação das Espécies Migratórias da Fauna Selvagem (CMS).

Causa da extinção

Relatos históricos de pesquisadores indicam que ao longo do século 20, as populações observadas do pássaro sempre foram pequenas. O biólogo russo Valentin Ushakov, que observou os pássaros entre 1909 e 1925, descreveu que os ninhos eram construídos no chão (facilitando o risco de acidentes e ataques) e que as fêmeas botavam até quatro ovos por estação, o que limitava o crescimento da espécie. Esse padrão reprodutivo, aliado à caça intensa, acelerou o desaparecimento.

Durante as rotas migratórias, a ave era caçada em grande número no sul da Europa e vendida em mercados locais, principalmente na Itália. O comércio de aves silvestres foi um dos fatores decisivos para o declínio da espécie, explicaram pesquisadores ligados ao Museu de História Natural de Londres.

O maçarico-de-bico-fino se reproduzia nas planícies úmidas da Sibéria Ocidental, no centro da Rússia, entre os meses de maio a agosto, e passava o outono e o inverno nas regiões mediterrâneas. O percurso migratório deles incluía distribuições no Oriente Médio, na Europa Central e no norte da África.

2 imagensFechar modal.1 de 2

Ilustração do início do século 20 mostra como era o maçarico-de-bico-fino (Numenius tenuirostris) declarado extinto em 10 de outubro de 2025

Reprodução / Wikimedia Commons2 de 2

Um dos últimos maçaricos-de-bico-fino, fotografado por Michel Brosselin em 15 de fevereiro de 1968 em Vendée, França

Reprodução/UICN

Impacto da expansão agrícola

Além da caça, a expansão da agricultura no século 20 agravou o problema de mortes entre os maçaricos-de-bico-fino. Áreas úmidas na antiga União Soviética, usadas para reprodução, foram convertidas em pastagens e campos de cultivo. O desaparecimento desses ecossistemas reduziu drasticamente as possibilidades deles de manterem ninhos saudáveis.

Instituições como a Royal Society for the Protection of Birds, a BirdLife International e o Naturalis Biodiversity Center já haviam alertado para a provável extinção do maçarico-de-bico-fino. Em 2024, um estudo revisou 1.400 registros históricos e concluiu que o último avistamento confirmado era o de 1995, no Marrocos.

“Uma espécie extinta não pode ser restaurada. Com as tecnologias e o conhecimento disponíveis hoje, não há desculpa para permitir que tragédias assim se repitam”, lamentou Nicola Crockford, presidente do grupo de trabalho conjunto CMS/BirdLife para o maçarico-de-bico-fino.

Perda simbólica e alerta global

O problema não é exclusivo da pequena ave, várias espécies estão cada vez mais próximas do desaparecimento. “Dois terços das espécies de aves estão em declínio. A extinção do maçarico-de-bico-fino mostra que políticas de conservação precisam ser aplicadas com rapidez e apoio científico”, afirmou Jacques Trouvilliez, secretário executivo do Acordo sobre a Conservação das Aves Aquáticas Migratórias Afro-Euroasiáticas (AEWA).

Além da ave, outras espécies foram recentemente declaradas extintas, no caso três marsupiais australianos: o bandicoot de Shark Bay (Perameles myosuros), o bandicoot listrado do sudeste (Perameles notina) e o bandicoot barrado de Nullarbor (Perameles papillon). A perda desses pequenos mamíferos reflete os impactos de predadores introduzidos pela ocupação humana, como cães e gatos, e a perda do habitat em caso de espécies de ocupação restrita podem ser fatais.

Embora o número total seja difícil de quantificar, extima-se que até um milhão de espécies correm risco de extinção. Apesar do cenário alarmante, a organização ressaltou exemplos positivos. A tartaruga-verde (Chelonia mydas), antes classificada como “Em Perigo”, passou para a categoria “Pouco preocupante” após décadas de proteção coordenada. A população cresceu cerca de 28% desde a década de 1970.

Siga a editoria de Saúde e Ciência no Instagram e fique por dentro de tudo sobre o assunto!