Por ser consumida in natura, sem passar por um processo químico, muitas pessoas chegam a pensar que a maconha não vicia. Embora as consequências sejam mais brandas, comparadas com outras substâncias como a cocaína e o álcool, a Cannabis também tem potencial de gerar dependência.
A Cannabis é a substância mais utilizada mundialmente. Nos Estados Unidos, 40% da população já usou maconha pelo menos uma vez na vida.
Já no Brasil, uma pesquisa feita em 2021 entrevistou por meio de um questionário 7.405 adultos e os pesquisadores descobriram que 17,1% dos participantes se classificavam como usuários ocasionais, enquanto 64,6 disseram fazer consumo frequente da Cannabis. Já 7,7% dos entrevistados se enquadraram como usuários disfuncionais, o que pode ser caracterizado como um transtorno no uso dessa substância.
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Outra pesquisa, desta vez do Instituto Datafolha, feita em 2023, entrevistou 1.949 pessoas em todo o país e indicou que um em cada cinco brasileiros já fumou maconha pelo menos uma vez na vida. E 5% destes admitiram que fazem uso da substância atualmente.
A Cannabis vicia?
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), de um a dois em cada dez usuários de maconha vai se tornar dependente, e quem adquire o hábito de fumar diariamente aumenta a taxa de desenvolver a dependência de 25% a 50%.
A dependência fisiológica acontece quando o corpo se adapta a uma substância e precisa dela para executar funções comuns do cotidiano. E esse processo é mais fácil de acontecer quando você é mais jovem.
Na adolescência, por exemplo, o córtex pré-frontal – responsável pela tomada de decisões – não está totalmente formado, o que acontece apenas ao completar 21 anos. Então, o uso abusivo de maconha nessa faixa etária pode prejudicar o seu desenvolvimento, bem como de alguns neurônios e células do sistema nervoso.
Nesse processo, o uso repetido da substância pode levar à tolerância, ou seja, o organismo vai precisar de doses cada vez maiores para conseguir os mesmos efeitos.
Segundo um estudo da Faculdade de Medicina da Universidade de Maryland, nos Estados Unidos, a Cannabis tem uma influência direta na liberação de dopamina, neurotransmissor responsável pela sensação de motivação, prazer a ativação do sistema de recompensa.
Ao fazer uso de maconha, existem efeitos satisfatórios como aumento dos 5 sentidos (paladar e audição mais aguçados, por exemplo), melhora do humor, euforia, relaxamento, melhora da criatividade e aumento da libido.
Ou seja, a busca por essas sensações satisfatórias (disparadas pela dopamina) está por trás do hábito de fumar de quem se torna dependente.
No entanto, a Cannabis não proporciona apenas sensações positivas. Ansiedade, paranoia e crise de pânico estão entre os efeitos negativos da planta no curto prazo.
A longo prazo, o dependente pode desenvolver a Síndrome Amotivacional, um transtorno caracterizado pela apatia, desinteresse e distanciamento emocional persistente. Além disso, diversos estudos relacionam o uso de Cannabis com o desenvolvimento da esquizofrenia.
“Há evidências que sugerem que o uso de Cannabis, principalmente o THC, em populações geneticamente predispostas ou de risco, leva a um diagnóstico mais precoce de psicose/esquizofrenia”, aponta artigo publicado na revista científica Cureus.
Mas, mesmo tendo experiências negativas com a maconha, algumas pessoas não conseguem parar de fumar.
Como saber se estou dependente?
O transtorno por uso de Cannabis é uma condição ainda pouco estudada pela ciência, a até desacreditada pelo senso comum, uma vez que a dependência em maconha não tem efeitos graves como os relacionados a outras substâncias. E há uma dificuldade geral em diferenciar usuários de dependentes, mas existem alguns comportamentos que podem sinalizar o uso abusivo.
Um ponto de atenção é a dificuldade crescente de ficar sem a substância. Quando a pessoa está sob uso, por exemplo, decide pela interrupção, mas ao se ver sem a substância não consegue sustentar a decisão.
Se atividades do cotidiano estão prejudicadas pela apatia, bem como há falta de interesse em atividades que antes geravam motivação, também é preciso ficar atento.
Segundo o psiquiatra Dartiu Xavier da Silveira, professor da Unifesp e pesquisador do tema, outro comportamento que pode dar início à dependência é a transição de um uso esporádico, recreacional, para um comportamento de uso diário com diversas justificativas.
“É o caso da pessoa que está nervosa, triste, ansiosa e decide fumar maconha como uma forma de aplacar esses sintomas”, explica o médico.
Para os casos em que é pessoa é identificada com o transtorno por uso de Cannabis, existem dois caminhos principais de tratamento, aponta Silveira. O primeiro é a redução de danos, ou redução progressiva, essa opção sugere a diminuição de uso da substância alterando a rotina com a inclusão de novas atividades no horário em que a pessoa costuma fumar, como exercícios físicos e hobbies.
A segunda opção é interromper totalmente o uso e focar em tratar e minimizar os sintomas de abstinência que podem vir a surgir, como dor de cabeça, irritabilidade, ansiedade e humor depressivo.
O abuso de substâncias, independente de qual seja, pode indicar alguma questão emocional que pode estar sendo suprimida pelo uso, identificar e trabalhar essas questões em terapia também pode ser uma alternativa para descobrir o que ocasiona o uso abusivo.
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