Ilha de Mocha, no Chile, é casa da baleia que inspirou Moby Dick

No século 19, alguns anos antes de Herman Melville publicar seu clássico Moby Dick, uma baleia real com características bem semelhantes fez fama pelo mundo: um gigantesco animal de cor branca que parecia imortal, capaz de rondar os oceanos com marcas dos arpões que não foram capazes de aniquilá-la. Seu nome? Mocha Dick.

A fama da baleia verdadeira se fez nos anos 1830, quase duas décadas antes de Melville lançar seu romance livremente inspirado no animal que povoou o imaginário de navegadores e baleeiros do período. Mocha – e não Moby – Dick tinha esse nome graças ao local em que era avistada: as vizinhanças da Ilha de Mocha, no litoral sul do Chile.

Um lugar de mares traiçoeiros, Mocha era naquele momento uma ilha deserta, conhecida pelo grande número de naufrágios em seus arredores e também cultuada em histórias de antigos viajantes como um refúgio de piratas. Para os nativos chilenos, os mapuche, era algo bem diferente: o lugar para onde suas almas se dirigiam quando a vida se encerrava.

Embora hoje tenha voltado a ser habitada, ainda que por menos de mil pessoas, a Ilha de Mocha continua a ser um lugar repleto de lendas, histórias e mistérios que mobiliza o imaginário de quem vai para a região de Arauco, na parte meridional do estreito mapa chileno. O lugar também continua relativamente inacessível: a 35 km da costa, não dispõe de serviços regulares de barco que levem até lá, e para visitá-la é preciso contratar transfers particulares de lancha ou avião monomotor.

A ilha sagrada dos mapuche

Uma velha tradição garante que o nome Mocha vem da língua dos lafkenches, um dos grupos originários pertencentes à grande nação mapuche que habitava essa parte do mapa antes da invasão europeia. Seria uma corruptela da junção de “Am”, que significa alma, e “Ucha”, ou ressuscitar. A combinação dos termos era a forma de descrever o lugar como um espaço de “Ressurreição das Almas”.

Faz sentido: na cosmovisão dos mapuche, esse era tradicionalmente o lugar para onde se dirigiam os espíritos dos mortos em busca da tranquilidade.

Continua após a publicidade

O aspecto deserto da ilha na época de Mocha Dick talvez até parecesse dar razão a essa imagem como um bom lugar para encontrar a paz isolado do resto do mundo: o lugar era protegido por bancos de areia indecifráveis, um campo magnético que tirava as bússolas do prumo e ainda tinha a baleia imortal. Mas o passado da ilha foi, na verdade, bem movimentado.

Contorno de Mocha é visível no horizonte em dias de menos nevoeiroPaola Retamal/Wikimedia Commons

Piratas e náufragos

Mesmo na época dos lafkenches, a ilha sagrada contava com alguns habitantes. Relatos de navegadores europeus desde o século 16 descrevem encontros hostis com os indígenas, que repeliam qualquer tentativa de aproximação a flechaços. Uma das histórias muito contadas sobre esse período garante que Francis Drake, o corsário inglês que deu a volta ao mundo entre 1577 e 1580, ficou com uma cicatriz no rosto após conhecer de perto os moradores de Mocha.

Pouco a pouco, as relações até melhoraram, mas criaram um problema novo. O que para os mapuche tinha se convertido em uma frutífera interação com estrangeiros, cujos barcos passavam esporadicamente por ali trocando mercadorias por um pouco de descanso e recursos encontrados na própria ilha, para o domínio imperial espanhol era algo bem diferente: uma perigosa proximidade com inimigos que os colonizadores enxergavam como piratas dispostos a surrupiar os recursos da Coroa.

Continua após a publicidade

Em 1685, com a brutalidade típica da época, a Espanha enviou uma missão dedicada a dizimar a população de Mocha, incendiar o que houvesse de casas e estruturas capazes de tornar o local minimamente habitável e deportar para o continente quem sobrevivesse. A ilha voltou a ser um espaço selvagem, difícil de ser acessado por navegadores sem experiência e, agora, sem qualquer interesse para os vivos diante da ausência de habitantes fixos.

No século e meio seguinte, Mocha voltou a ser uma terra de espíritos ancestrais e um lugar mais famoso pelas dificuldades que impunha aos navegantes, virando cenário de inúmeros naufrágios. Consta que um desvio nos campos magnéticos da Terra se intensifica por ali, que as bússolas passam a confundir os viajantes e que os barcos finalmente acabam encalhando nas águas rasas ao seu redor.

Tem como visitar?

O retorno da Ilha Mocha como um lugar habitado só veio na metade final do século 19, muito tempo depois dos últimos mapuche ou de Mocha Dick serem vistos por ali. Desta vez, no lugar dos povos originários, vieram colonos de ascendência europeia mesmo. Hoje, a população permanente da ilha é de cerca de 700 pessoas, que vivem majoritariamente da agricultura, em casinhas espalhadas pelo território insular.

É possível visitar a ilha e há, inclusive, dois hotéis para se hospedar, o Punta Norte e o Punta del Saco. Os moradores também alugam chalés e há alternativas para acampar. Em qualquer cenário, a pegada é voltada ao ecoturismo e às aventuras, com atividades para explorar as reservas naturais, fazer avistamento de aves e trekkings e cavalgadas para conhecendo os quatro cantos da ilha.

Continua após a publicidade

Como não há transporte regular até Mocha, os interessados devem se dirigir à cidade de Tirúa, no continente, e contratar de forma particular algum dos serviços locais que fazem a travessia. De lancha, a viagem leva cerca de três horas. Já de avião, são apenas 15 minutos, mas pode ser necessário um pouco de coragem: as pequenas “avionetas” levam apenas seis pessoas por vez.

Leia tudo sobre o Chile

Compartilhe essa matéria via:

Resolva sua viagem aqui

Reserve hospedagem no Booking

Reserve seu voo

Reserve hospedagem no Airbnb

Ache um passeio na Civitatis

Alugue um carro

Publicidade