No Reino Unido, em 2023, oito bebês nasceram com DNA de três pessoas para, segundo os médicos, evitar situações devastadoras e fatais, aponta a BBC.
Passados cerca de um ano e dois meses da divulgação do feito, surge a notícia de que o propósito da “experiência” foi alcançado: os pequenos não nasceram com doenças hereditárias, deixando seus pais aliviados e felizes.
Esse método é permitido há uma década no Reino Unido e combina o óvulo de uma mãe e o esperma de um pai com o óvulo de uma mulher doadora. A técnica, segundo a BBC, foi iniciada por cientistas britânicos.
Quais são as doenças das quais os bebês estão livres?
A comprovação de que os bebês nasceram sem doenças hereditárias é a prova de que a técnica funciona;
Essas enfermidades são as doenças mitocondriais incuráveis;
Esses tipos de doenças são costumeiramente passadas da mãe para a criança, privando o corpo dela de energia;
Essa privação pode causar incapacidade grave, enquanto alguns bebês morrem apenas após alguns dias de nascidos;
Os casais sabem que há risco caso crianças anteriores, familiares ou mães foram afetados.
Como a doença mitocondrial afeta os bebês
As mitocôndrias são estruturas minúsculas localizadas em quase todas as células de nosso corpo. É por elas que respiramos, pois elas usam oxigênio para converter alimentos em energia para utilizarmos como combustível.
As mitocôndrias doentes são capazes de deixar nosso corpo com energia insuficiente para manter o coração batendo e pode, ainda, causar danos ao cérebro, convulsões, cegueira, fraqueza muscular e falência dos órgãos.
Estatísticas apontam que cerca de um em cada cinco mil bebês nascem com a doença mitocondrial. Os responsáveis pela aplicação da técnica preveem que haja demanda por 20 a 30 bebês nascidos pelo método pioneiro a cada ano.
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E como funciona a técnica de DNAs de três pessoas?
As mitocôndrias são transmitidas somente de mãe para filho. Logo, a técnica, desenvolvida há mais de dez anos na Universidade de Newcastle e no Newcastle upon Tyne Hospitals NHS Foundation Trust e um serviço especializado aberto no NHS em 2017, usa uma mulher doadora com mitocôndrias saudáveis.
Os óvulos da mãe e da doadora são fertilizados em laboratório com o esperma do pai. A seguir, os embriões vão se desenvolvendo até que o DNA do espermatozoide e do óvulo formem um par de estruturas denominadas pró-núcleos.
Essas estruturas possuem os “projetos” para a constituição do corpo do bebê, tais como cor do cabelo e altura. Depois, são removidos dos pró-núcleos e o DNA dos pais é introduzido no embrião cheio de mitocôndrias saudáveis.
O resultado é uma criança geneticamente relacionada aos pais, mas livre de doenças mitocondriais. Ou seja, os bebês nascem com boa parte do DNA dos pais, mas recebem cerca de 0,1% da mulher doadora. E o melhor: a mudança é transmitida através das gerações.
Relatórios do New England Journal of Medicine aponta que 22 famílias se submeteram à técnica no Centro de Fertilidade de Newcastle. O resultado foi de quatro meninas e quatro meninos, sendo um par de gêmeos, além de uma gravidez.
“Para ver o alívio e a alegria nos rostos dos pais desses bebês depois de uma espera tão longa e medo das consequências, é brilhante poder ver esses bebês vivos, prosperando e se desenvolvendo normalmente”, disse Bobby McFarland, diretor do Serviço altamente especializado do NHS para Transtornos Mitocondriais Raros à BBC.
Todos os bebês nasceram sem doenças mitocondriais e atingiram o desenvolvimento esperado. Contudo, um dos bebês teve epilepsia, caso que foi esclarecido por si só, além de outro, que possui ritmo cardíaco anormal, mas que vem sendo tratado com louvor. Os pesquisadores alertam que as intercorrências não devem ser ligadas às mitocôndrias defeituosas.
Até o momento, não se sabe se isso faz parte dos riscos já conhecidos da fertilização in vitro, algo peculiar no caso do compartilhamento de DNA de três pessoas, ou algo detectado somente porque a saúde desses bebês em particular é constantemente monitorada.
Além disso, os cientistas querem saber se as mitocôndrias defeituosas seriam transferidas para o embrião são e qual a consequência disso.
Nos resultados dos testes realizados após os nascimentos, em cinco bebês, as mitocôndrias doentes eram indetectáveis. Nos demais, entre 5% e 20% delas estavam com problemas, acusados em exames de sangue e urina.
Contudo, o nível estimado que se pensa causar doenças é de 80%. Agora, são necessários mais testes para entender as razões disso e se pode ser evitado.
A professora Mary Herbert, da Universidade de Newcastle e da Universidade de Monash, disse, sobre as descobertas: “As descobertas dão motivos para otimismo. No entanto, a pesquisa para entender melhor as limitações das tecnologias de doação mitocondrial será essencial para melhorar ainda mais os resultados do tratamento.”
Liz Curtis, fundadora da instituição de caridade Lily Foundation, pontuou: “Depois de anos de espera, agora sabemos que oito bebês nasceram usando essa técnica, todos sem sinais de mito. Para muitas famílias afetadas, é a primeira esperança real de quebrar o ciclo dessa condição hereditária.”
Famílias felizes e esperançosas
Nenhuma das famílias que participaram da experiência deram declarações públicas, mas se pronunciaram anonimamente por meio do Centro de Fertilidade de Newcastle, onde os procedimentos ocorreram.
“Depois de anos de incerteza, esse tratamento nos deu esperança – e, depois, nos deu nosso bebê. Nós olhamos para eles agora, cheios de vida e possibilidade e estamos sobrecarregados de gratidão”, disse a mãe de uma menina.
Já a mãe de um menino declarou que “graças a este incrível avanço e ao apoio que recebemos, nossa pequena família está completa. O fardo emocional da doença mitocondrial foi levantado e, em seu lugar, está a esperança, a alegria e a profunda gratidão”.
Todavia, há aqueles cujos filhos nasceram com a doença e lutam diariamente contra ela. A família Kitto é um caso. O filho mais velho de Kat, Lily, 16 anos, tem a possibilidade de passar a hereditariedade para seus filhos. A mais nova, Poppy, 14 anos, nasceu com a enfermidade.
Poppy vive com uma cadeira de rodas, não fala e só consegue se alimentas graças a um tubo que envia nutrientes para seu estômago. “Isso impactou uma grande parte de sua vida. Temos um tempo adorável como ela é, mas há os momentos em que você percebe o quão devastadora é a doença mitocondrial”, desabafa Kat.
Já são décadas de trabalho, mas ainda não há cura para a condição. Contudo, a chance de impedir que ela nasça com as crianças é motivo de esperança para Kat. “São as gerações futuras, como eu, ou meus filhos, ou meus primos, que podem ter essa visão de uma vida normal”, disse.
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