Introduzida no Brasil na década de 1970 como alternativa para alimentação de gado e recuperação de áreas degradadas, a leucena (Leucaena leucocephala) deixou de ser vista como uma planta útil e passou a ser considerada um problema ambiental em diversas regiões do país. Embora seu crescimento rápido e resistência a solos pobres tenham sido inicialmente vistos como qualidades, a espécie se mostrou extremamente agressiva.
A planta se espalha com facilidade, forma verdadeiras monoculturas e impede o crescimento de plantas nativas. Hoje, o desafio é evitar que ela continue se alastrando e prejudicando ainda mais os ecossistemas brasileiros. A engenheira florestal Silvia Ziller, fundadora do Instituto Hórus de Desenvolvimento e Conservação Ambiental, explica que a leucena está oficialmente listada como espécie exótica invasora no Brasil — e também integra a lista das 100 piores invasoras do mundo, elaborada pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN).
“Ela causa dominância do espaço pela exclusão e eliminação de espécies nativas, altera os padrões sucessionais e reduz a disponibilidade de alimento para a fauna”, afirma. A árvore, originária do México, também modifica a paisagem e pode afetar a regeneração natural da vegetação, sobretudo em áreas de Mata Atlântica, Cerrado e Restinga.
Leia também
Plantas conversam? Saiba como elas se defendem de ameaças
O que significa ter muitas plantas em casa, de acordo com a psicologia
Plantas tóxicas para cães: veja as principais e evite ter em casa
5 plantas que ajudam a afastar escorpiões de sua casa; confira
Na prática, a erradicação da leucena é considerada praticamente inviável devido à ampla disseminação da espécie. “No Brasil, não há um programa nacional específico de erradicação da leucena, e sim algumas iniciativas pontuais de controle. Os esforços normalmente se concentram em áreas prioritárias para conservação e restauração ambiental”, explica Silvia.
Um dos exemplos vem da capital catarinense: “O município de Florianópolis tem no momento um esforço específico para controle da leucena”, destaca a especialista. Nessas regiões, a planta é removida manualmente ou com apoio de ferramentas, e em seguida são inseridas espécies nativas adaptadas ao ecossistema local.
Na Chapada dos Veadeiros (GO), o técnico agrícola e guia local Mauro Araújo relata que a infestação da leucena já é visível em diversos pontos da região, incluindo a rodovia GO-239, áreas urbanas e até zonas de expansão do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros. “Ela interfere diretamente na vegetação nativa pelo seu efeito alelopático muito forte”, afirma.
Esse efeito se refere à capacidade da planta de liberar substâncias químicas no solo que inibem o crescimento de outras espécies — um dos motivos pelos quais a leucena avança de forma tão agressiva. Mauro também alerta que a população local ainda desconhece os riscos.
“Nos passeios, informo os visitantes sobre o prejuízo ambiental”, diz. Para ele, o enfrentamento da espécie precisa ser constante: “A infestação deve ser combatida com batalhas permanentes. O poder público tem obrigação de atuar com campanhas e informações contínuas para a erradicação.”
A base de dados do Instituto Hórus mostra que a leucena já foi registrada em praticamente todas as regiões do Brasil. A árvore atinge desde áreas rurais de pastagem até parques nacionais e reservas biológicas, afetando diretamente a biodiversidade de locais sensíveis. Em muitos casos, como nas restingas do litoral de Santa Catarina, a planta compete com espécies nativas e impede que a vegetação local retome seu espaço após a remoção.
Outro esforço relevante vem sendo conduzido pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente de Alto Paraíso (GO), que tem atuado no mapeamento e controle da planta em áreas de Cerrado. Ações locais buscam conter o avanço da leucena em trilhas, margens de estrada e regiões próximas a áreas protegidas, com apoio de moradores e guias ambientais.
Sobre o tempo necessário para restaurar uma área dominada por leucena, Silvia afirma que não existem respostas simples. “Depende muito do grau de invasão, do tipo de ambiente e do histórico de uso da terra. Em áreas cercadas por vegetação conservada, a regeneração é mais fácil. Já em locais degradados ou cercados por agricultura intensiva, o retorno da vegetação nativa pode ser bem mais difícil”, explica.
Para recuperar áreas invadidas, o ideal é plantar espécies pioneiras nativas — aquelas que conseguem se estabelecer rapidamente e preparam o terreno para outras plantas mais sensíveis. Mas a escolha dessas espécies deve levar em conta as condições ecológicas de cada região, como solo, clima e vegetação original. “Cada ambiente exige um conjunto diferente de soluções”, completa a engenheira.
Silvia também faz um alerta para quem ainda cultiva leucena, muitas vezes sem saber dos riscos: “É importante buscar espécies alternativas que não sejam invasoras. Se ainda for necessário usar a leucena, que se faça o controle ao redor das áreas de cultivo para evitar sua dispersão. Mas a recomendação é clara: se não há necessidade real, não plante. Os impactos são sérios”, reforça.
A história da leucena é um exemplo emblemático de como boas intenções nem sempre resultam em boas consequências ambientais. A introdução de espécies exóticas precisa ser cuidadosamente avaliada, com base científica e em diálogo com especialistas em ecologia, para evitar desequilíbrios que podem levar décadas — ou até séculos — para serem corrigidos.
Siga a editoria de Saúde e Ciência no Instagram e fique por dentro de tudo sobre o assunto!